Patologia.
Quando a obstrução coronária se tornar definitiva, e o coagulo (atrombose) obstruir por completo a artéria, o musculo não irrigado morre. E uma zona do musculo cardíaco que fica destruída e é a isso que se chama « enfarte do miocárdio». O enfarte do miocárdio, sobretudo na fase aguda (e mais que tudo nas primeiras horas) é uma situação gravíssima que obriga a internamento hospitalar imediato, para vigilância electrocardiografica e tratamento das complicações possíveis.
Hoje em dia uma nova esperança surge quando se verifica que, se o doente com enfarte chegar ao Hospital antes de passarem quatro horas sobre o inicio, é possível, por cateterismo cardíaco, canalizar a artéria coronária doente e injectar nela uma substância capaz de dissolver o coagulo recém-formado e de novo permitir a circulação do sangue para a zona que estava ameaçada de morte.
Por muito que esta terapêutica, quando aplicada precocemente, possa ser salvadora e impedir o enfarte, ou na dor anginosa resistente se façam enxertos com segmentos de vasos venosos ou arteriais que permitem ultrapassar a estenose existente, não podemos esquecer que tudo isso poderia ter sido evitado, a começar pela doença arterial generalizada (a aterosclerose), se, em devido tempo, a começar na infância, se tivesse feito uma educação para a saúde, criando hábitos salutares de exercício, controlo do peso e das calorias na alimentação, redução das gorduras saturadas da manteiga, queijo e ovos (e uso de insaturadas : milho, girassol e soja que são poli-insaturadas, além do azeite, que é mono-insaturado) e a prevenção ou a supressão do habito de fumar, sem esquecer a contenção no uso do sal.
Na evolução dum enfarte do miocárdio são muito frequentes arritmias cardíacas (e é para vigilância e combate às arritmias, eventualmente mortais, que se querem estes doentes em « unidades coronárias »). Contudo perturbações do ritmo cardíaco podem surgir também em quase todas as outras afecções cardíacas, valvulares ou outras (incluindo uma lesão benigna, muito frequente, da válvula mitral, o « prolapso da válvula mitral », ou as chamadas « síndromes de pré-excitação ventricular »). Arritmia cardíaca pode inclusive surgir com relativa frequência em pessoas inteiramente normais, sobretudo nas de natureza mais nervosa, quer sob stress, ou porque abusam de café, do tabaco ou do alcool, ou até com « colite », ou com meteorismo abdominal (distensão por gases) exagerado.
Uma vez que o problema das arritmias é complexo, até para os cardiologistas (até ja temos « arritmologistas », isto é, especialistas de arritmias), diremos so que o termo arritmia é mais um titulo de um livro do que um diagnostico, pois que engloba todas as perturbações do ritmo, e elas são muitas e variadas, desde as mais benignas às mais graves.
Arritmias quase sempre benignas são as extrassistoles, que todos sentimos ocasionalmente : sobrepondo-se ao ritmo habitual, de resto normal, surgem inesperadamente uma ou mais batidas irregulares que nos afligem (ao sentir uma falha, ou uma pancada mais forte), mas não têm qualquer importância : são pancadas (sístoles) isoladas e fora do ritmo, provocadas por excitabilidade aumentada das fibras musculares cardíacas, quer auriculares, quer ventriculares, em resposta aos estímulos ja citados.
« Arritmia completa » chama-se à fibrilação auricular, por activação eléctrica desordenada das auriculas, passando o estimulo eléctrico para os ventrículos a intervalos irregulares, ainda que controláveis pela noss terapêutica medicamentosa. Crises de taquicardia (frequência maior que 100/m) ou bradicardia (menor que 60/m) podem corresponder a situações as mais das vezes benignas, outras vezes por exemplo a doença do proprio nódulo sinusal e o seu significado e o seu tratamento exigem um diagnostico electro-cardiografico, com um registo obtido durante a crise.
Ha outro tipo de arritmias em que, em vez de alteração da excitabilidade, quase sempre exagerada, se identificam perturbações da conductibilidade, com interrupção mais ou menos grave e mais ou menos intermitente da passagem do estimulo eléctrico das aurículas para os ventrículos – é nestes « bloqueios auriculoventriculares » (quer eles surjam espontaneamente, quer no contexto dum enfarte agudo do miocárdio) que se impõe muitas vezes a implantação de pacemaker (« marca-passo » para os brasileiros) espécie de bateria, ou pilha eléctrica, suplementar, capaz de tomar à sua conta a activação eléctrica do musculo cardíaco e consequentemente de manter as contracções cardíacas que asseguram a vida e a integridade da circulação do sangue.
Sem querer pormenorizar exageradamente a descrição dos males que podem afligir o coração de cada um de nos, pareceu-nos todavia que o leitor teria interesse em conhecer um pouco o que pode eventualmente vir a passar-se consigo, ou com qualquer das pessoas que neste mundo são importantes para si, sobretudo para que possa evita-lo, ou então ajudar a tratar melhor, com mais consciência do que faz ou do que tem de fazer. Falta-nos ainda falar da hipertensão arterial. Talvez não saiba, por exemplo, que, para là da hipertensão arterial sistémica, aquela de que todos falam, ha também uma hipertensão arterial pulmonar.
Nas doenças pulmonares crônicas, tipo bronquite crônica ou enfisema, a deficiente eliminação de anidrido carbônico e a ma captação de oxigénio pelos pulmões doentes podem dar origem a hipertensão no circuito arterial pulmonar (na chamada pequena circulação), duplicando ou triplicando os habituais valores de 25 a 30 mm de mercúrio. Tanto basta para que o coração direito possa falhar e entra rem insuficiência cardíaca, originando inchaço (edema) do fígado e dos membros inferiores.
A esta situação se chama « coração pulmonar crônico », por se apresentar como doença cardíaca o que é afinal insuficiência do coração direito face à hipertensão no circuito pulmonar que, alias, so melhorara significativamente com o tratamento da própria doença pulmonar, melhorando a ventilação (a absorção de O2 e a eliminação de CO2).
A hipertensão arterial do circuito arterial sistémico (grande circulação) é a vulgar « hipertensão arterial », hoje em dia tão falada. Embora seja quase sempre de natureza « essencial » – isto é, não se lhe conhece verdadeiramente a causa – a hipertensão arterial pode nalguns casos relativamente raros (cerca de 5%) ser secundaria a uma doença conhecida. Podem por exemplo provocar hipertensão arterial certas doenças do rim (nefrite crônica, pielonefrite, estenose da artéria renal) ou alguns tumores das glândulas supra-renais (síndroma de Cushing, hiperaldosteronismo, feocromocitoma).
Pode também a hipertensão arterial (na metade superior do corpo) dever-se à ja citada malformação congénita que apelidamos de coarctação da aorta.
Também o uso prolongado de contraceptivos orais pode condicionar uma gradual subida da tensão arterial, o que obriga à sua medição frequente, pelo menos nos primeiros meses de uso da « pílula » anticoncepcional. Se a tensão subir ha que escolher outro método de planeamento familiar. Na grande maioria dos casos (cerca de 95 em cada 100) a elevação da pressão arterial acima dos 14/9 (140/90 mm Hg) tem causa desconhecida, e por se lhe desconhecer a essência se fala em hipertensão essencial.
Acontece todavia que a subida da tensão com a idade se observa praticamente so nas populações « civilizadas », que consomem mais de 3 a 5 gramas de sal por dia. Parece assim que o sal, decerto somado a influências genéticas, tem grandes « culpas no cartório » no que respeita à hipertensão. Alias, o excesso de peso e o consumo exagerado de alcool parecem ter também efeito significativo sobre a subida de pressão arterial.
Não admira pois que os portugueses, consumindo cerca de 18 gramas de sal por dia (!), com excesso de peso e bebendo bastante, sejam neste momento « campeões mundiais » da hipertensão arterial. Convém dizer aqui, para termos uma ideia mais correcta das grandezas, que até aos 40 anos de idade se admite que a pressão sistólica normal possa ir até aos 140mm, mas para efeitos práticos, e dada esta subida com a idade, aceita-se que aos 50, 60 ou 70 anos a pressão maxima (ou sistólica) possa atingir 150, 160 ou 170 mm Hg, respectivamente, sem exigir necessariamente tratamento medicamentoso para a baixar.
Também no que respeita ao peso se pode dizer que muitos portugueses ainda pensam que « gordura é formosura » e por isso é tão frequente ter « uma arroba » de peso a mais – não devemos exceder em quilos o numero de centímetros que temos acima do metro de altura (ou seja, por exemplo, não exceder 70 kg se se mede 1,70 m ou 60 kg para 1,60m). E ja que estamos a falar de números, ainda direi que o consumo diário de sal não deve exceder o limite superior permitido pela Organização Mundial de Saúde, que são os 5 gramas por dia, e que quem beber vinho se deve limitar a um máximo de um decilitro em cada uma das duas refeições maiores.
Bibliografia
(1) Extratos do opúsculo do Professor-Doutor Fernando de Padua.