Fernando Pessoa – Escritor, poeta, articulista e médium espirita.

Introdução.

 

Desde a minha juventude, ouvia-se falar de Fernando Pessoa, enquanto escritor, poeta e articulista. Grande poeta português!

Os anos foram passando e um certo dia falávamos de mediunidade escrevente e alguém nos da o exemplo da existência deste tipo de mediunidade na pessoa do poeta. Por de pronto, esta informação foi uma revelação e dai em diante procurei conhecer melhor a sua obra e as suas predisposições.

Encontrando-me a passar férias no norte de Portugal, no verão de 2015, tive o prazer de trocar impressões com Arnaldo Costeira, espirita e autor de diversas obras, entre outras « No Vulcão dos Preconceitos » dedicada a Fernando Pessoa e à elite dos escritores portugueses do fim do século XIX e princípios do século XX, que conjuntamente exerceram um papel importante no panorama cultural português, da sua época.

O modernismo chegou a Portugal numa época, mundialmente muito perturbada. Portugal sofria de um concurso de circunstâncias bastante difícil, com o fim da monarquia em 1910. A instalação do regime republicano desenvolveu-se numa situação bastante conflituosa e com grandes perturbações e cobiças sôbre as colônias africanas.

Com as grandes correntes europeias sôbre o Futurismo e o Expressionismo, novas concepções da estética, aparece em 1915 em Portugal a revista Orpheu, que muito naturalmente se integra nesta corrente. Na sua existência encontram-se expoentes da literatura portuguesa como Fernando Pessoa, Mario Sa Carneiro, Almada Negreiros, Luiz de Montalvor e Ronald de Carvalho.

Este movimento cultural e artístico, conhecido como Modernismo, não so influenciou, finalmente, a estética mas todas as artes : literatura, pintura, cinema, musica e renovou o espirito critico, em relação com o tradicionalismo, então, existente.

Se a nossa intenção, hoje, é de apresentar Fernando Pessoa, os laços que o ligam a outros homens da sua época não deixara de transparecer neste nosso relato. Também não vimos apresentar a biografia do grande literato português e de renome mundial, mas antes repôr, junto dos leitores e companheiros espiritas, quem ele foi na realidade e o que ele representa.

Muitos dos seus leitores e estudados da obra de Fernando Pessoa, leram sôbre os seus heterônimos, isto é, as múltiplas personagens que assinavam seus escritos, mas desde ja avançamos que seus biógrafos esconderam a realidade de quem elas representavam para ele.

Certamente que o grande escritor português, não deixou clara esta questão, o que contribuiu para a omissão de quem estava apressado em utilizar a sua obra, com fins lucrativos, e não se deu ao esforço de investigar e compreender, o que estava ao alcance do cidadão desinteressado e honesto.

Não é caso único, no panorama artístico e das letras, pois também mais tarde Florbela Espanca, sofreu do mesmo desdém. O desprezo pelas liberdades publicas, a opressão e a repressão, contra as ideias de quem vem abalar o estado de coisas tradicionalista e comodista, fôram certamente a miscelânea que pressionou todos eles a esconderem a Mediunidade de que eram portadores.

 

Vida de Fernando Pessoa.

 

De seu verdadeiro nome Fernando Antonio Nogueira Pessoa, nasceu em Lisboa no dia 13 de Junho de 1888 e ai desfalece em 30 de Novembro de 1935. Seu pai era funcionário na secretaria de Estado e critico musical, e desfalece de tuberculose em 1893, contando Fernando 5 anos. Data de 1895 o seu primeiro poema « A Minha Querida Mamã » cuja assinatura é Chevalier de Pas.

Sua mãe volta a casar-se em 1895 com um militar, consul de Portugal na cidade de Durban na Africa do Sul, dai que o jovem passe parte da sua infância neste pais da Africa Austral. Desde que aqui aportou, Fernando vai estudar e consegue fazer quatro anos de instrução primaria em dois, devido à sua precocidade. Em 1899, ingressa na Escola Comercial de Durban (Durban Commercial School), dai a sua facilidade para escrever em inglês, língua na qual foram publicadas muitas das suas obras.

Em 1901 escreve poemas, em inglês, sob o pseudônimo de Alexander Search. Experimenta escrever novelas, mas a sua tentativa não tem sucesso. Neste mesmo ano termina com distinção o primeiro exame « Cape School High Examination » Um episódio vai marcar a sua vida, nessa altura, o falecimento da sua irmã Madalena Henrieta com dois anos. Volta a Portugal com a família de férias durante um ano.

Escreve, então, o poema dedicado à irmã « Quando ela passa ». Fernando Pessoa vai utilizar muito o inglês, particularmente em traduções de poetas inglêses. Candidata-se em 1903 na Universidade do Cabo – Africa do Sul – mas não obteve boa classificação, no entanto consegue a melhor nota no ensaio de estilo inglês, entre 899 candidatos. O que lhe vale o prémio « Queen Victoria Memorial Prize ». Volta à escola « Durban High School », onde frequenta o equivalente a um primeiro ano universitário. Vai, então, dedicar-se a ler os clássicos inglêses e latinos. Publica no jornal do liceu um ensaio critico « Macaulay ». Termina os seus estudos Sul-Africanos com a obtenção do « Intermediate Examination in Arts, na Universidade, com boa classificação.

Regressa definitivamente a Lisboa em 1905, deixando a família em Durban, e passa a viver com a avo. Na medida em que a família, residente na Africa do Sul, volta a Portugal, Fernando vai morar com ela. Continua a escrever poemas em inglês e em 1906 matricula-se no Curso Superior de Letras na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, que abandona no decorrer do ano.

Entra em contacto com grandes escritores portugueses, e vai-se interessar pela obra de Cesario Verde e pelos sermões do Padre Antonio Vieira. Em 1907 falece sua avo e dela recebe uma pequena herança, o que o leva a montar uma tipografia « Empresa Ibis », mas pouco tempo depois abre falência.

Em 1908 passa a traduzir correspondência comercial, sera a sua actividade durante toda a sua vida. Vai então iniciar-se como ensaísta e critico literário com o artigo «  A Nova Poesia Portuguesa Sociologicamente Considerada, seguem-se-lhe « Reincidindo… e A Nova Poesia Portuguesa no Seu Aspecto Psicológico », publicados pela Revista A Aguia, órgão da Renascença Portuguesa em 1912.

Dai frequenta a Tertulia literária no Café A Brasileira, na qual se destaca, seu tio adoptivo, o poeta e general em aposentação Henrique Rosa, para mais tarde passar a frequentar o Café Martinho da Arcada, na Praça do Comércio na década de 1920, aonde escrevia e encontrava amigos.

No decorrer de 1915 cria a participa na revista literária « Orpheu » que deu impulso ao movimento modernista em Portugal, sem deixar de criar controvérsia e causando algum escândalo. Apenas publicou 2 números.

Em outubro de 1924 lança juntamente com o artista plástico Ruy Vaz a revista « Athena », na qual fixou o « drama em gente » dos seus « heterônimos », publicando poesias de Ricardo Reis, Alvaro de Campo e Alberto Caeiro, e ainda dêle proprio.

Embora tenha sido acabado o terceiro numero jamais foi publicado por razões econômicas.

Os únicos livros publicados em vida são os das colectâneas dos seus poemas ingleses : Antinous, 35 Sonnets et English Poems I – II e III, editados em Lisboa, em 1918 e 1921, assim como « Mensagem ».

Doente, assoberbado por entidades inferiores que o levam a desviar-se da sua missão, entrega-se ao consume de álcool e alimenta-se mal, daí é internado no Hospital de São Luis dos Franceses, em Lisboa com diagnostico de « cólica hepática » causada por calculo biliar associado a cirrose hepática, em 29 de Novembro de 1935, diagnostico hoje contestado por estudos médicos.

Fernando Pessoa desfalece a 30 de novembro de 1935 com 47 anos de idade. « Durante a sua vida, e principalmente depois de atravessar a fronteira para o mundo espiritual, Fernando Pessoa foi biografado por diversos autores que tudo fizeram para atribuir as suas faculdades mediúnicas a simples episódios depressivos, neurológicos, psíquicos e outras extravagâncias que camcaram aos pés as mais singelas afirmações do poeta que vivera estratificando entre preconceitos e conveniências da época e a cultura materialista que ganhou foros de cidadania nesse período bem cinzento do republicanismo doente e intolerante. »

« Alguns dos autoproclamados amigos viriam a atribuir a faceta real do poeta às suas extravagâncias psíquicas, a raiar a loucura. » Esqueceram mesmo as afirmações do poeta, as suas convicções, as suas inclinações para escrever as « Cartas Astrológicas », que fazia sem disso ter consciência, prova evidente, como lhe revelara um grande amigo e médium na primeira década do século, que essas « coisas não eram dele, pois delas não tinha consciência. Fernando Pessoa foi vitima de sua própria imprevidência e do triste preconceito social que  tem impedido que a Doutrina Espirita, que ele conheceu de perto em suas multifacetadas dimensões, possa estar disponível para reproduzir  a dor nesta Humanidade distante de Deus e afastar de caminhos ínvios um cortejo infindo de depressivos e angustiados que enchem Hospitais e fazem da medicação aplicável um dos melhores e mais promissores negócios deste mundo materialista ».

Fernando Pessoa era detentor de grandes capacidades mediúnicas e foi um estudioso de Cesare Lombroso e dai se convenceu da realidade dos fenômenos espiritas. Estudou a obra deste grande médico e cientista italiano « Hipnotismo e Mediunidade ».

O poeta era consciente da sua faculdade, por prova as suas cartas a seu amigo Mario Sa Carneiro, embora não tivesse conhecimento do assédio de que era vitima por parte das entidades comunicantes, dai que sua tia o tenha levado ao contacto com o Espiritismo. Eram as presenças de seres difusos que Fernando não entendia, que « me perturbavam as noites, ou me desafiavam a fazer o que ainda não compreendia ». « Logo meus caros, era mediunidade pura, embora não educada, não desenvolvida, não entendida na sua verdadeira dimensão ».

« A mediunidade tem essa faceta. Os que dela são portadores precisam de uma vigilância aturada para se não deixarem envolver nos caminhos onde aves rapaces procuram locupetar-se, destruindo ou desviando os caminhantes ». A confusão instalou-se em minha mente, na sequência desses episódios tremendos que me avassalaram, em especial aquele que afastaria Sa Carneiro do meu convívio ».

Em relação ao Espiritismo : « … frequentei, tornei-me crente, e fui, sem sombra de dúvida, médium na verdadeira acepção da palavra. Médium e descontrolado, entregue a forças inferiores, a partir da partida de minha Tia Anica para a Suíça ».

Vale a pena dar relevo ao conteúdo desses parágrafos da minha carta quando rememoro todos aqueles que eu via ao meu redor, que ouvia e a quem de imediato, como se os conhecesse de longa data, dava os nomes de forma clara e sem hesitação ».)  (Fernando Pessoa – No Vulcão dos Preconceitos – da autoria de Arnaldo Costeira).

Muito lhe agradeço a sua carta de 13 e os parabéns que me traz. Muito agradeço também a carta do Raúl de 22 de Maio, a que responderei brevemente; creio que assim posso prometer, porque me sinto agora já um pouco melhor, já mais apto a não ter a inércia que tenho tido e que, como calcula, tem sido devida aos sucessivos choques nervosos por que tenho passado.

Felizmente que chegaram (enfim!) de Pretória notícias acentuadamente boas. Excepto no que respeita ao braço, que está demorando em recuperar o movimento, o estado da Mamã melhorou muito. O estado mental está, enfim, normal. Aquela confusão mental que ela tinha, e que era o que mais me impressionava, desapareceu. E ela já sai do quarto, passando umas horas por dia na casa de jantar.

 

Carta à Tia Anica – 24 Jun. 1916.

 

« Lisboa, 24 de Junho de 1916.

Minha querida Tia:

Não sei o tratamento empregado agora. Sei que, a princípio, empregaram, com efeito, os choques eléctricos, mas suspenderam esse tratamento, porque, ao que parece, incomodava demasiadamente a doente. E suponho que naquela altura da doença não seria bom o incómodo natural dos choques. Se assim foi, já terão, suponho, retomado esse tratamento.

Por enquanto não há nada em que, de positivo, se deva assentar com respeito à guerra e às tropas de aqui irem para fora. E creio, mesmo, que os rapazes na situação do Raúl não correm, por enquanto, grande risco de serem chamados. É claro que não posso afirmar isto, mas é o que consta aqui. Já se o Raúl estivesse cá, naturalmente teria, pelo menos, a maçada de uma «escola de oficiais» ou qualquer aparelho parecido. Sobre o estado nervoso em que tenho vivido, não tenho passado mal ultimamente. Também creio que não tem havido novidade na família, salvo que a Joaquina está umas vezes melhor, outras pior. Como eu tinha previsto, pela astrologia, a situação do Mário não só melhorou, mas parece tender para melhorar cada vez mais. Vamos agora ao caso misterioso que a interessa e que a tia Anica diz não poder calcular o que seja.  Sim, não calcula, decerto eu próprio é o que menos esperaria. O facto é o seguinte. Aí por fins de Março (se não me engano) comecei a ser médium. Imagine! Eu, que (como deve recordar-se) era um elemento atrasador nas sessões semi-espíritas que fazíamos, comecei, de repente, com a escrita automática.

Estava uma vez em casa, de noite, tendo vindo da Brasileira, quando senti a vontade de, literalmente, pegar numa caneta e pô-la sobre o papel. É claro que depois é que dei por o facto de que tinha sido esse impulso. No momento, não reparei no facto, tomei-o como o facto, natural em quem está distraído, de pegar numa pena para fazer rabiscos. Nessa primeira sessão comecei por a assinatura (bem conhecida de mim) «Manuel Gualdino da Cunha». Eu nem de longe estava pensando no tio Cunha. Depois escrevi mais umas cousas, sem relevo, nem interesse nem importância.

De vez em quando, umas vezes voluntariamente, outras obrigado, escrevo. Mas raras vezes são «comunicações» compreensíveis. Certas frases percebem-se. E há sobretudo uma cousa curiosíssima — uma tendência irritante para me responder a perguntas com números; assim como há a tendência para desenhar. Não são desenhos de cousas, mas de sinais cabalísticos e maçónicos, símbolos do ocultismo e cousas assim que me perturbam um pouco. Não é nada que se pareça com a escrita automática da Tia Anica ou da Maria — uma narrativa, uma série de respostas em linguagem coerente. É assim mais imperfeito, mas muito mais misterioso.

Devo dizer que o pretenso espírito do tio Cunha nunca mais se manifestou pela escrita (nem de outra maneira). As comunicações actuais são, por assim dizer, anónimas e sempre que pergunto «quem é que fala?» faz-me desenhos ou escreve-me números. Mando-lhe, junta, uma amostra simples, que não é preciso devolver-me. Nesta há números e rabiscos, mas quase que não há desenhos. É singular que, apesar de eu não perceber nada de tais números, consultei um amigo meu, ocultista e magnetizador (uma criatura muito curiosa e interessante, além de ser um excelente amigo) e ele disse-me cousas singulares. Por exemplo, eu disse-lhe uma vez que tinha escrito um número qualquer (de quatro algarismos) de que não me recordo agora. Ele respondeu-me que havia cinco pessoas na casa onde eu estava. E, com efeito, assim era. Mas ele não me diz de onde é que concluiu isso.

Explicou-me apenas que esse facto de eu escrever números era prova da autenticidade da minha escrita automática, isto é de que não era auto-sugestão. Mas mediunidade legitima.

Os espíritos, diz ele, fazem essas comunicações para dar essa garantia; e essas comunicações são, por isso mesmo, incompreensíveis ao médium, e de ordem que mesmo o inconsciente dele era incapaz de imaginar (?). Este meu amigo tem-me explicado outros números assim, com igual, e curiosa, segurança. Só houve três números que ele não compreendeu. Estou contando rapidamente, e claro, e necessariamente omito pormenores e detalhes interessantes. O que narro, porém, é o essencial. Não pára aqui a minha mediunidade. Descobri uma outra espécie de qualidade mediúnica, que até aqui eu não só nunca sentira, mas que, por assim dizer, só sentia negativamente.

Quando o Sá-Carneiro atravessava em Paris a grande crise mental, que o havia de levar ao suicídio, eu senti a crise aqui, caiu sobre mim uma súbita depressão vinda do exterior, que eu, ao momento, não consegui explicar-me. Esta forma de sensibilidade não tem tido continuação. Guardo, porém, para o fim o detalhe mais interessante. É que estou desenvolvendo qualidades não só de médium escrevente, mas também de médium vidente. Começo a ter aquilo a que os ocultistas chamam «a visão astral», e também a chamada «visão etérica». Tudo isto está muito em princípio, mas não admite dúvidas. É tudo, por enquanto, imperfeito e em certos momentos só, mas nesses momentos existe.

Há momentos, por exemplo, em que tenho perfeitamente alvoradas (?) de «visão etérica», em que vejo a «aura magnética» de algumas pessoas, e, sobretudo, a minha ao espelho e, no escuro, irradiando-me das mãos. Não é alucinação porque o que eu vejo outros vêem-no, pelo menos, um outro, com qualidades destas mais desenvolvidas. Cheguei, num momento feliz de visão etérica, a ver na Brasileira do Rossio, de manhã, as costelas de um indivíduo através do fato e da pele. Isto é que é a visão etérica em seu pleno grau. Chegarei eu a tê-la realmente, isto é, mais nítida e sempre que quiser ? A «visão astral» está muito imperfeita. Mas às vezes, de noite, fecho os olhos e há uma sucessão de pequenos quadros, muito rápidos, muito nítidos (tão nítidos como qualquer cousa do mundo exterior). Há figuras estranhas, desenhos, sinais simbólicos, números (também já tenho visto números), etc.

E há, o que é uma sensação muito curiosa, por vezes o sentir-me de repente pertença de qualquer outra cousa. O meu braço direito, por exemplo, começa a ser-me levantado no ar sem eu querer. (É claro que posso resistir, mas o facto é que não o quis levantar nessa ocasião). Outras vezes sou feito cair para um lado, como se estivesse magnetizado, etc.

Perguntará a Tia Anica em que é que isto me perturba, e em que é que estes fenómenos, aliás ainda tão rudimentares, me incomodam? Não é o susto. Há mais curiosidade do que susto, ainda que haja às vezes cousas que metem um certo respeito, como quando, várias vezes, olhando para o espelho, a minha cara desaparece e me surge um fácies de homem de barbas, ou um outro qualquer (são quatro, ao todo, os que assim me aparecem).

O que me incomoda um pouco é que eu sei pouco mais ou menos o que isto significa. Não julgue que é a loucura. Não é: dá-se até o facto curioso de, em matéria de equilíbrio mental, eu estar bem como nunca estive. É que tudo isto não é o vulgar desenvolvimento de qualidades de médium. Já sei o bastante das ciências ocultas para reconhecer que estão sendo acordados em mim os sentidos chamados superiores para um fim qualquer que o Mestre desconhecido, que assim me vai iniciando, ao impor-me essa existência superior, me vai dar um sofrimento muito maior do que até aqui tenho tido, e aquele desgosto profundo de tudo que vem com a aquisição destas altas faculdades é acompanhado duma misteriosa sensação de isolamento e de abandono que enche de amargura até ao fundo da alma.

Enfim, será o que tiver de ser. Eu não digo tudo, porque nem tudo se pode dizer.

Mas digo o bastante para que, vagamente, me compreenda. Não sei se realmente julgará que estou doido. Creio que não. Estas cousas são anormais sim, mas não anti-naturais. Pedia-lhe o favor de não falar nisto a ninguém. Não há vantagem nenhuma, e há muitas desvantagens (algumas, talvez, de ordem desconhecida) em fazê-lo.

Adeus, minha querida Tia. Saudades à Maria e ao Raúl. Beijos ao Eduardinho. Para si muitos e muitos abraços do seu sobrinho muito amigo e grato,

                 Fernando »

 


 

Ndr. : Esta brochura foi concebida afim de retirar duvidas sôbre Fernando Pessoa e esclarecer, tanto quanto possível, a parte escondida da sua personagem enquanto médium.

Heterônimos : Sôb a forma de personagens eram na realidade Espíritos que lhe comunicavam, pela mediunidade que o escritor possuía, os seus escritos, e, de forma alguma uma invenção do escritor.

 

Bibliografia

 

Fernando Pessoa – « No Vulcão dos Preconceitos » obra realizada por Arnaldo Costeira. E informações bibliográficas do poeta na internet.