A primeira referência conhecida à reencarnação remonta ao século VII a.C., com o orfismo, antiga religião de mistérios da Grécia. De ai em diante, figuras incontornaveis da cultura ocidental, como Pitagoras (séc.VI a.C.), Platão (séc. V-IV a.C.), Cicero e Virgilio (séc. I a.C.) e Filon de Alexandria (c.20 a.C. – c.50 d.C.) escreveram e ensinaram sobre a reencarnação e, ao que tudo indica, o tema não era mera especulação de intelectuais, mas a expressão escrita de uma crença corrente.
Temos de lembrar, para entendermos o desfecho de negação da reencarnação pelas igrejas cristãs, que associado àquela estava o conceito de união a Deus. O significado deste conceito diz-nos que todos somes filhos de Deus ; como tal, a salvação é um processo individual que depende do esforço proprio, sem intermediarios, e que a união com Deus é possivel, depois do ciclo das reencarnações.
Isto leva-nos ja para o Primeiro Concilio de Niceia, em 325, em que é formulado o Credo de Niceia, que afirma a divindade de Jesus como unico Filho de Deus. Esta afirmação tem como consequência que sendo a humanidade uma espécie de bastardos e proscritos, não so fica dependente de intermediação, neste caso da Igreja. Dai o « fora da igreja não ha salvação ».
No fundo, a estrutura àquele tempo emergente era mais de natureza politica que religiosa e pretendia perpetuar um certo poder – e basta ver o papel que governantes temporais desempenharam nessa mesma estrutura. Depois de Jesus e antes do concilio atras referido, surge o neoplatonismo, que foi uma escola greco-romana de filosofia que ensinou a reencarnação e a união com Deus, e surge principalmente Origenes (c. 185-c. 254), Patriarca de Igreja, figura importante como pensador e divulgador destes conceitos, que so bem casam se um com outro.
Pois bem, tendo pelo meio alguns episodios uns verdadeiros, outros talvez so anedoticos (e cuja descrição aqui não é relevante), o certo é que Justiniano I (486-565), imperador desde 527, em cerca do ano 529 reprime os hereges e os pagãos ; com o édito de c. 543 condena os 10 principios do origenismo ; com a Carta de c.551 dita os 15 anatemas contra o origenismo, e em 553 convoca o Quinto Concilio Geral da Igreja, precisamente para impor como principio de fé os 15 anatemas, os quais foram a base para a rejeição da reencarnação.
Tem sido dito e aceitado que este foi o concilio em que a Igreja eliminou da sua doutrina a reencarnação (depois do Primeiro Concilio de Niceia este fim era inevitacel, era apenas uma questão de tempo) ; porém, os anatemas contra Origenes não aparecem nas actas do Concilio. A propria Enciclopédia Catolica duvida que Origenes e o origenismo tenham sido realmente excomungados. E que essa era a vontade do imperador mas talvez não fosse a da maioria dos bispos presentes no concilio, e por isso a omissão.
De qualquer modo a Igreja assimilou os anatemas e pô-los em pratica. De tal sorte que quando o catarismo (c. 1150 a 1310), doutrina que ensinava a reencarnação e a união com Deus, se tornou uma ameaça incapaz de ser eliminada pela « persuasão » inquisitorial, uma Cruzada de 15.000 cruzados e mercenarios durante 20 anos passou a fio de espada todo o Languedoc, com a ordem, diz-se, de matar todos, que « Deus » reconheceria os seus.
E foi assim que, de chacina em chacina e de fogueira em fogueira (Giordano Bruno entre outros e como exemplo), a Igreja deixou de ser « luz do mundo e sal da terra ». Apesar disso, continuamos com filiação divina e a reencarnar, muitos de nos provavelmente para propagar com dor a verdade que deliberadamente reprimimos.
Apesar da tola presunção, ainda não se conseguiu alterar nem deter nenhuma lei natural. Apesar da Igreja, a Boa Nova de Jesus continua perene, luminosa e libertadora.
Biografia
Este artigo é um dos temas apresentados no livro « Eridano – Arvi T. Pekkonnen », pag. 75,76,77, da autoria de Antonio Augusto Pinho da Silva, médium e fundador e dirigente da Associação Cultural Espirita Mudança Interior de Vale de Cambra no distrito de Aveiro em Portugal.